«Foi divulgado esta terça-feira [28-Mai-2024] pelo Ministério da Administração Interna, o
Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) alerta para o aumento dos
crimes violentos, como extorsão, roubo e rapto, no ano passado. De
acordo com o documento, as autoridades investigaram também mais crimes
relacionados com o tráfico de pessoas e auxílio à imigração ilegal e
foram abertos mais inquéritos de criminalidade económico-financeira. Os
crimes de ódio e a ameaça ligada à extrema-direita também aumentaram em
2023, assim como a violência entre grupos rivais de jovens de bairros da
Grande Lisboa.
Extorsão, roubo e rapto entre os crimes violentos que mais subiram em 2023 O RASI revela que a criminalidade violenta e grave aumentou 5,6%, registando-se 14.022 crimes, mais 741 casos do que em 2022, o valor mais alto desde 2019.
Também
a criminalidade geral aumentou 8,2% em 2023, tendo os oito Órgãos de
Polícia Criminal (GNR, PSP, PJ, SEF, Polícia Marítima, ASAE, Autoridade
Tributárias e Polícia Judiciária Militar) recebido 371.995 queixas, mais
28.150 participações que no período homólogo de 2022, o valor mais
elevado desde 2014 (último registo do RASI).
O RASI indica que as subidas mais relevantes no
capítulo da criminalidade grave e violenta são a extorsão, que apresenta
uma subida de 25,8%, para o rapto sequestro e tomada de reféns (+22%),
para a resistência e coacção sobre funcionário (+13,2%), roubo por
esticão (+7,7%) e roubo na via pública (+0,8%). O documento precisa que
os crimes de roubo, nas diferentes formas, são responsáveis por 64% do
total das ocorrências violentas e graves registadas.
As maiores descidas verificaram-se no roubo em residência (-15,3%), violação (-4,8%), outros roubos (-4%) e homicídio voluntário consumado (-7,2%).
A
criminalidade violenta e grave subiu no ano passado nos distritos da
Guarda (68,3%), Bragança (54,3%), Viseu (36,1%) e Setúbal (26,6%),
enquanto as descidas ocorreram em Castelo Branco (29,1%), Região
Autónoma da Madeira (17,8%), Santarém (14,4%) e Leiria (6,1%).
No
âmbito da criminalidade geral, a violência doméstica é o crime que
continua a apresentar maiores índices de queixas, apesar de ter
registado uma ligeira descida de 0,1% no ano passado.
Os crimes participados às polícias que mais subiram em 2023 foram o abuso de cartão de garantia ou de crédito
(+67%), outras burlas (+39%), tráfico de droga (+20,1), furto em
edifício comercial ou industrial sem arrombamento, escalamento ou chaves
falsas (+16,7%) e furto de oportunidade de objecto não guardado
(+13,4%).
O furto em residência com arrombamento, escalamento ou
chaves falsas (-11,2%) e furto em veículo motorizado (-6,8%) foram os
crimes que mais desceram no ano passado.
O documento destaca ainda
os crimes que aumentaram em resultado da “proatividade policial”, como
detenção ou tráfico de armas proibidas (10,6%), condução com taxa de
álcool (9,3%), condução sem habilitação legal (9,2%), resistência e
coacção sobre funcionário (13,2%) e desobediência (18,3%). Segundo o
RASI, apenas o distrito de Coimbra apresenta uma ligeira diminuição da
criminalidade geral, registando-se os maiores aumentos em Faro (+13,5%),
Setúbal (+12,9%), Beja (+12,3%) e Leiria (+12,1%).
Inquéritos a criminalidade económico-financeira aumentaram 28,8% Os
inquéritos a criminalidade económico-financeira, corrupção e
criminalidade conexa aumentaram 28,8% em 2023, sendo o maior número de
investigações abertas relativas ao crime de branqueamento de capitais.
Nas tipologias de crime, destaca-se a “prevaricação de titular de cargo
político”, onde se verificou um acréscimo de 138%, seguido da “corrupção
activa no sector privado” (60%), “participação económica em negócio”
(58%), “peculato de uso” (58%), “branqueamento” (47%) e “abuso de poder”
(46%).
“Em sentido oposto, denota-se que as tipologias de insolvências, que
baixaram 15%, fraude e desvio de subsídio (menos 12%), crimes fiscais e
aduaneiros (menos 22%), corrupção activa no desporto (menos 20%),
corrupção de titulares de cargos políticos (menos 13%), corrupção
passiva (menos 7%) e recebimento indevido de vantagem (menos 10%)
mantiveram, em 2023, a tendência decrescente já iniciada em 2022”,
indica o documento.
Em relação à constituição de arguidos por
relação aos tipos de crime, o crime de “branqueamento” representou a
infracção com o maior número de arguidos, 20% do total.
Paralelamente,
no que respeita a detenções no âmbito da criminalidade
económico-financeira, regista-se, desde 2020, uma tendência gradual
crescente de detenções neste tipo de criminalidade. O RASI 2023 regista 121 detidos (mais 26%), dos quais 74% do sexo masculino. O número de arguidos baixou 13,9%, descendo para um total de 852.
O
RASI revela que foi na categoria dos “crimes fiscais e aduaneiros” – na
qual se integra a fraude fiscal, a receptação e o contrabando – que foi
registado um maior aumento de detenções (mais 16%), todas respeitantes
ao sexo masculino. “De sublinhar que, em 2023, ocorreram detenções ao
nível da “insolvência” e “abuso de poder”, quando, nos anos precedentes,
o registo de detenções nestas infracções foi nulo”, indica ainda o
relatório.
De acordo com o RASI, 2023 veio confirmar tendências já identificadas
em anos anteriores, nomeadamente o crescimento dos crimes informáticos
ou praticados em meio informático, tipos penais procedentes do
branqueamento, através da utilização de diferentes estratégias por
organizações criminosas, tais como fraude com supostas aquisições de
criptomoeda e fraude de investimento, entre outros.
Investigações de crimes de tráfico de pessoas e auxílio à imigração ilegal dispararam em 2023
Os
inquéritos relacionados com crimes de tráfico de pessoas e auxílio à
imigração ilegal aumentaram exponencialmente no ano passado, acréscimos
em termos percentuais superiores a 150% e de quase 300%, respectivamente.
O RASI refere que essa tendência de aumento do número de
inquéritos por “tráfico de pessoas” e por “auxílio à imigração ilegal”
acontece nos últimos anos.
No crime de “tráfico de
pessoas”, com relevância para a exploração laboral, a variação em 2023
reflete “um acréscimo em termos percentuais de 158%”, indica o
documento.
Os inquéritos pelo crime de “auxílio à imigração ilegal” registaram um aumento de 298%, havendo também novas investigações sobre a prática dos crimes de “associação de auxílio à imigração ilegal”.
Tribunais determinam prisão preventiva para 13 suspeitos de tráfico de seres humanos no Alentejo
O relatório nota que o aumento significativo das duas investigações também se relaciona com a reestruturação do Sistema de Segurança Interna
e a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), resultando
na transferência de competências para a Polícia Judiciária.
O
aumento das investigações levou também a um elevado número de arguidos
constituídos e de detidos no ano passado, especialmente os detidos pela
prática do crime de “auxílio à imigração ilegal”. Em 2023 também
aumentaram as sinalizações sobre vítimas dos dois crimes, com Portugal a
ser essencialmente país de destino de vítimas (355 registos).
Dos
casos de presumível tráfico de pessoas, 84% relacionam-se com
exploração laboral, em sectores como a silvicultura e a pesca marítima
costeira, mas principalmente na agricultura e futebol.
No ano passado foram sinalizados 57 menores vítimas desse tráfico,
a maior parte associadas a uma operação do SEF (Operação Eldorado) e
tratando-se especialmente de rapazes com uma média de idade de 16 anos.
Foram
sinalizados ao todo 533 adultos presumíveis vítimas de tráfico em
Portugal, a maior parte dos casos confirmados associados à mesma
operação, homens com idades entre os 18 e os 23 anos, maioritariamente
do Brasil, Colômbia e Guiné-Bissau. Os distritos com mais casos de presumível exploração foram Braga (futebol), Beja (agricultura) e Bragança (agricultura e silvicultura).
Os
dados indicam ainda que em 2023 foram acolhidas 57 (presumíveis)
vítimas nos Centros de Acolhimento e Protecção, das quais 39 do sexo
masculino. A maioria das vítimas foi alvo de tráfico para fins de
exploração laboral (incluindo servidão doméstica) mas outras principais
formas de exploração foram sexual, mendicidade forçada, adopção ilegal e
escravidão.
Aumenta violência entre grupos rivais de jovens de bairros da Grande Lisboa O RASI alerta também para o aumento da violência associada a grupos juvenis e jovens motivada por rivalidades entre grupos oriundos de diferentes zonas ou bairros da área metropolitana de Lisboa.
“No
que respeita à criminalidade grupal foram efectuadas 2.048 detenções
(+13,1%). Relativamente à violência efectuada no âmbito grupal, tem-se
assistido, no período pós-confinamento, a um acréscimo na
conflitualidade e no nível de violência empregue”, refere o documento.
O
documento destaca as dinâmicas decorrentes de grupos juvenis e jovens e
as que envolvem grupos criminosos organizados, em especial os que se
dedicam ao tráfico de droga.
Segundo o RASI, a criminalidade
grupal, definida como o cometimento de crime por três ou mais suspeitos,
aumentou 14,6% em 2023, registando um total de 6.756 ocorrências, o
valor mais elevado desde 2014.
Também a delinquência juvenil, que
compreende crimes praticados por jovens entre os 12 e os 16 anos,
registou um aumento de 8,7%, num total de 1.833, número mais alto desde
2017.
No âmbito da criminalidade grupal, refere o RASI, os
suspeitos são jovens com idades compreendidas entre os 15 e 25 anos de
idade, sendo um fenómeno que tem tido uma considerável expressão na Área
Metropolitana de Lisboa.
“Continuam a verificar-se algumas dinâmicas associadas a rivalidades
entre grupos oriundos de diferentes zonas ou bairros da área
metropolitana. Esses conflitos costumam ser referidos em músicas e
videoclips de subculturas musicais que apresentam referências
hiperlocais e hiperpessoais (especificamente a uma área geográfica,
ocorrência em particular, indivíduo ou data específica)”, lê-se no
documento, que destaca “o papel desempenhado pelo digital, nomeadamente
as redes sociais, que se apresentam como extensão do grupo e do próprio
bairro”.
Relativamente à delinquência juvenil, o RASI dá conta que
ao longo dos anos de 2022 e 2023, foram realizadas algumas
investigações e operações levadas a cabo pelas forças e serviços de
segurança, mas mesmo assim deve existir “um número considerável de
cifras negras (crimes não reportados)”.
O documento refere também
que, na área metropolitana de Lisboa, é nos concelhos de Loures e da
Amadora que existe maior número de ocorrências e destaca os locais de
crimes junto a centros comerciais e estações intermodais, “potenciando
assim a repercussão de notícias em órgãos de comunicação social e
consequente sentimento de insegurança”.
“Nota-se ainda uma
tendência de episódios (alguns não denunciados) junto de
estabelecimentos de ensino, provavelmente porque os autores conhecem
algumas rotinas das vítimas e os estabelecimentos que frequentam”,
salienta o RASI, dando ainda conta dos grupos associados ao tráfico de
droga, nomeadamente os grupos que se dedicam à venda a retalho, com uma
presença mais localizada junto dos principais pontos de venda das duas
áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.
O relatório indica ainda
que há um grande número de ocorrências violentas e graves na margem sul
do Tejo, principalmente a zona do Barreiro, onde existem ofensas à
integridade física, sequestro e rapto de indivíduos associados ao
tráfico de droga.
Crimes ligados ao tráfico e consumo de drogas aumentaram 19,4% em 2023 Os crimes ligados ao tráfico e consumo de droga aumentaram 19,4%, face ao ano anterior. O RASI dá igualmente conta de um “aumento substancial” da actividade criminosa de tráfico de droga, bem como das quantidades apreendidas.
O
RASI regista um total de 37.947 quilos de haxixe apreendidos (+62,3%
face ao ano anterior), 21.721 quilos de cocaína (+31,4%), 41 quilos de
heroína (- 43,5%) e 91.054 unidades de ecstasy (+47,3%).
No que se
refere ao número de apreensões registadas no documento de 2023, o
haxixe lidera com 5.806 (+22,4%), seguindo-se a cocaína com 2.105
(+4,8%), a heroína com 1.073 (- 14,3%) e o ‘ecstasy’ com 807 (+31,2%).
Sete detidos, incluindo um ex-PSP, em operação que desmantelou rede de tráfico de droga do norte do país
O documento destaca o “crack” (droga para fumar) como tendo
vindo a criar algum alarme social, tendo sido registado nos últimos anos
um aumento das quantidades apreendidas. Em 2021 foram
apreendidos 36,65 quilos em quatro apreensões, no ano seguinte 4.925
quilos em 325 apreensões e em 2023 foram apreendidos 7.113 quilos em 293
apreensões.
Quanto aos intervenientes no tráfico e consumo, foram
registados 9.001, dos quais 7.565 acabaram detidos. Entre os detidos,
6.884 foram homens, dos quais 6.098 com 21 anos ou mais e entre eles
5.986 de nacionalidade portuguesa. As operações realizadas pelas
autoridades policiais levaram à apreensão de 4,51 milhões de euros, 16
embarcações de alta velocidade, 236 viaturas ligeiras, 2.344 telemóveis e
130 armas de vários tipos.
O relatório aponta que, à semelhança
do que sucede em outros países, também em Portugal se tem vindo a
constatar que diferentes organizações criminosas procuram infiltrar-se
em infraestruturas portuárias e aeroportuárias existentes em território
nacional, através do recrutamento de trabalhadores de diferentes
entidades, designadamente prestadoras de serviços.
“O objectivo é o
de conseguirem, com o apoio de tais trabalhadores, criar o que
poderemos designar por verdadeiras ‘vias verdes’ para a entrada de
grandes quantidades de estupefaciente em território nacional e,
concomitantemente, no espaço europeu”, sublinha o documento, que
sublinha igualmente que, para além do tráfico em grande escala,
verifica-se também “uma crescente utilização de serviços de correios e
de encomendas postais, através dos quais as organizações criminosas
fazem chegar as drogas ao consumidor final (sobretudo as sintéticas)”.»